Como recente membro do projecto educativo das Irmãs Doroteias, senti que a minha integração deveria iniciar-se pelo desafio de real compreensão não apenas do que é, mas do que deve ser Ser-se Relação.
Digamos que do ponto de vista teológico, se nos apresentam de forma evidente e necessária os valores Fraternidade, Diálogo, Amizade… Mas eis que, numa perspectiva filosófica, metódica e racionalmente crítica, a prática desses valores inerentes ao Ser Relação se desvelam também como uma necessidade.
Na prática pedagógica de introdução à Filosofia e ao filosofar, isto é, nas primeiras sessões de Filosofia com alunos do 10º ano, é comum recorrermos à Alegoria da Caverna de Platão como forma de apresentação e apreensão daquilo que poderemos chamar atitude verdadeiramente filosófica. De capacidade e vontade de abertura, de curiosidade e de questionamento, visando uma compreensão integral e unificadora do mundo que nos rodeia. Por outro lado, a vontade de autêntica comunicação, como o prisioneiro da Alegoria da Caverna que, após se ter desprendido e vislumbrado uma possível outra face da realidade, regressa à caverna com o intuito de transportar a experiência do espanto aos seus.
Neste sentido, e não esquecendo o objectivo de perscrutar a essência do Ser Relação, cremos interessante recordar que da Grécia helénica herdamos algumas distinções úteis para o universo dos afectos. Assim, temos eros que, segundo Sócrates, é a fonte do desejo de nos amarmos uns aos outros; storgé, o amor familiar e instintivo de carinho, ternura e afecto; xenía, aquele amor que sentimos por desconhecidos; phília, o amor da amizade, e ágape, a forma mais elevada de amor, incondicional e de sacrifício pessoal.
Ora, numa viagem pela filosofia dos afectos apercebemo-nos que Ser Relação assume uma pretensão de união e comprometimento com eros, storgé, xenía, phília e acima de tudo com ágape, com o Espírito de Família entendido como Humanidade.
Neste ponto cremos que será, portanto, legítimo inferir que, se do ponto de vista teológico é imediato, porque acto de fé, este comprometimento com a Humanidade, do ponto de vista filosófico não será menos essencial. Pois se é possível postular que aquilo que é amável o é por si mesmo, e este seria o Homem como criação divina, é também possível afirmar que Ser-se Relação é, pois, vontade de autêntica comunicação, despida de pré-conceitos, genuína, ou seja, filosófica! E, acima de tudo, é-o também por si mesma!
Por Cecília Reis Maia
Texto publicado no Jornal da Paz, nº18,Set-Out 2011