A verdade e o conhecimento da realidade são construções de ordem intersubjectiva. A intersubjectividade exige condições: o reconhecimento de racionalidade no outro, a existência de um sistema simbólico de comunicação e a partilha de um contexto. O conceito de contexto remete para a temporalidade e historicidade e é fundamental na compreensão (doação/construção de sentido) de quaisquer fenómenos e realidades.
Para ser admitida como verdade com alcance intersubjectivo e ambição de universalidade, qualquer teoria, lei ou tese tem de ser reconhecida como tal. Esta admissão, nunca marcada pelo dogmatismo e espírito acrítico, deve surgir como consequência de um processo de criticismo argumentativo.
Por criticismo argumentativo entende-se um exercício racional de crítica ancorado na Lógica e aplicado à situação argumentativa com o propósito de distinguir os argumentos válidos dos inválidos (lógica formal) e assegurar a defesa contra usos manipulativos da retórica (lógica informal). O criticismo argumentativo funda-se no sentido crítico, “músculo” intelectual e instrumento de descodificação de discursos, desenvolvido primeiramente por aquilo que os Gregos designaram por cultivo do estudo livre. De facto, o estudo livre é a melhor medida de defesa contra a manipulação. Se este for efectivamente livre e as capacidades críticas das pessoas forem estimuladas e bem-vindas, os argumentos falaciosos, por mais atraentes que sejam, acabarão por ser denunciados no processo de avaliação crítica das ideias. A liberdade de estudo e discussão, oposta ao dogmatismo e ao seguimento de Gurus e Mestres, é o maior aliado da razão e o pior inimigo da manipulação.
O problema da busca da verdade ou da sua construção ocupou nos últimos milénios algumas das mais brilhantes mentes da História: Platão, Aristóteles S.Tomás de Aquino, Hume, Mill, Kant, Ortega y Gasset, Paul Ricoeur, Richard Rorty … A concepção absoluta e a perspectiva relativista da verdade têm na História e na Cultura o seu campo de batalha. Será a verdade um núcleo exterior ao Homem, existente por si e em si, ou, pelo contrário, mais uma produção humana em constante actualização? Talvez o mais importante seja que a construamos enquanto a procuramos; uma construção humana (quiçá demasiado humana), bem alicerçada, se bem que nunca permanente, uma verdade à medida do Homem e a medida do humano define-se pelo respeito do outro e pela ideia/sentimento de justiça, semente da acção ética.
Nuno Paulos Tavares