domingo, 14 de maio de 2023

O Conceito de Enteléquia

 


Relembrando o conceito de Enteléquia - Do grego entelechia - energia que age.

ARISTÓTELES forjou este vocábulo apoiando-se na expressão "o facto de possuir perfeição". Enquanto tal, o termo 'enteléquia' significa a actualidade ou perfeição resultante de uma actualização. A enteléquia é, então, o acto enquanto realizado. Neste sentido, a enteléquia distingue-se da actividade ou actualização.

Como constitui a perfeição do processo de actualização, a Enteléquia é a realização de um processo cujo fim reside na própria entidade.

Para LEIBNIZ, as enteléquias são "todas as substâncias simples ou mónadas criadas, pois têm em si certa perfeição e há nelas certa capacidade de se bastarem a si mesmas, o que as torna fontes das suas acções internas".

Em Leibniz, o termo continua a ter, como em Aristóteles, o significado primeiro de "o facto de possuir perfeição".

sexta-feira, 17 de março de 2023

PARTIR DE UM LIVRO À ESCOLHA NA BIBLIOTECA E NÃO DEIXAR OS NOSSOS PENSAMENTOS DORMENTES


Para esta sessão de Filosofia para Crianças com o 3º ano, o Vicente foi convidado a escolher um livro das estantes da Biblioteca Municipal de Torres Vedras. A Ana, técnica do serviço educativo da biblioteca, deu uma ajuda e guiou o grupo pela sala infantil e juvenil, e ao assunto de poesia infantil. O Vicente não sabia que existia essa secção e ficou até surpreendido com isso, mas, ainda assim, preferiu escolher um livro em português. A escolha do Vicente foi Rua do Abecedário, de Augusto Múrias, do qual foi lida uma pequena parte, também à sua escolha: «Das letras conhecidas tem as pernas mais compridas, incapaz de forças juntar e de em pé se aguentar. Ao erguer-se valente, sente o corpo dormente e desata a gritar…»
A partir deste excerto partilhado, o grupo foi convidado a desenhar o que tinha percebido.
Um dos alunos apresentou o seu desenho, constituído por letras, uma das letras foi personificada e tinha umas pernas longas e com nuances de cinzento, que mostrava que estavam dormentes. E o desenho tinha «mais algumas coisas sem sentido.» Explorando este «sem sentido» perguntei ao grupo exemplos de outras coisas sem sentido, ao que a aluna M. respondeu com «uma tesoura que não corta», seguindo-se «um lápis que não escreve», «uma caneta que não escreve», «uma afia que não afia» e «uma televisão que não dá».
Mas esta televisão que não dá fez-me exatamente pensar no caso de uma televisão antiga e avariada que tenho em casa e da qual fiz um aquário. O Nemo vive nesse aquário. Assim, parece que estamos perante o caso de uma televisão que não dá e isso não lhe retira o sentido.
O grupo reagiu de imediato apontando que «assim já não era uma televisão»; que «Se a televisão funcionasse e o peixe estivesse lá dentro, avariava. Não era possível.» Ou, como ser coisas diferentes sob o mesmo aspeto era contraditório, «tínhamos de mudar o nome a esse objeto.»
Fazer depender o sentido da função reunia tacitamente o acordo do grupo e uma hipótese de continuar a exploração seria perceber se esta dependência se aplicaria da mesma forma a uma ideia, a um humano, a um ser vivo…
Porém, dirigimo-nos para outras apresentações de desenhos, que mostraram que o par de palavras dormente e valente não podia acontecer em simultâneo.
Acontecia ficarmos dormentes quando deixamos uma parte do corpo na mesma posição durante muito tempo. Por exemplo, «ficar sentado em cima de uma perna durante muito tempo», «dormir na mesma posição durante muito tempo», «quando os pés ficam no ar e não chegam ao chão» ou mesmo «quando se fica com o dedo no ar, à espera de falar, durante muito tempo.» De imediato fiquei a pensar que devia um pedido de desculpas à A., por demorar demasiado tempo a passar-lhe a palavra. Mas ela esclareceu-me que não era ali, na sessão. Era em casa quando queria dizer alguma coisa e os pais só falavam e falavam entre eles. 😌
E o grupo acabou por terminar a sessão reencontrando a pergunta que inicialmente colocou, «O que é a Filosofia?»
Pensar sempre na mesma ideia, durante muito tempo, pode pôr os nossos pensamentos e a nossa mente dormentes e, para que tal não aconteça, podemos «procurar coisas novas na internet», «ler coisas diferentes», «conversar com as outras pessoas», parecendo-nos que dialogar com o diferente possa ser uma muito satisfatória definição de Filosofia e uma ótima forma de não deixar os nossos pensamentos ficarem dormentes.

📸Vera Fortunato










sábado, 11 de fevereiro de 2023

«FAZER FIGURINHAS» - de uma sessão de Filosofia para Crianças para outras

Numa sessão de Filosofia para Crianças (#FpC) em que perguntei quais os objetivos dos presentes para 2023.
Não, não pense que há ausência de objetivos nestas turmas do 3º e 4º anos. Entrar para a equipa de basquete, aprender a tocar guitarra, tirar boas notas a Português, marcar golos e ganhar à equipa na 2ª volta do campeonato, são apenas os poucos que a minha memória reteve. Estas e um que deteve a minha atenção. «-Fazer figurinhas, muitas! 50... não 200! Ou mais!»
Achei muito curioso e perguntei o que era isso de «fazer figurinhas». Todos quase ao mesmo tempo na sala me explicaram que "figurinhas" é o nome que, no Brasil, se dá àquilo que em Portugal se chama de cromos, que se colam e colecionam em cadernetas.
A velocidade com que todos me explicaram, o som desta rapidez e algumas caras de ...ah, já sabia! fizeram-me compreender que o K. faz mesmo muitas figurinhas e tem inclusivamente cadernetas inteiras totalmente originais.
Pedi-lhe se mas podia mostrar, pois estava muito interessada. Adorei, são lindas e ficam nas fotos abaixo.
Deixei-lhe a ideia - que aqui também partilho convosco - de propor à professora a realização pela turma de uma ou várias cadernetas de figurinhas.
A título de exemplo, As Figurinhas da Justiça - assim como certos elementos compuseram a equipa de futebol da Argentina no último mundial e o Messi não pode faltar, haverá certamente elementos que compõe a Justiça (ou outro tema qualquer que se deseje explorar), sendo que alguns não poderão faltar (condições necessárias vs suficentes que podem ajudar a definir um conceito);
Se assim se entender também poderá trabalhar-se individualmente - As Minhas Figurinhas. Afinal, todos nós somos ou fazemos figurinhas, passamos por situações que nos fizeram ser ou fazer figurinhas, ou temos figurinhas que gostaríamos de ser e outras mesmo de não ser ou fazer.
Penso que a própria expressão «Fazer Figurinhas» tem grandes potencialidades de exploração filosófica. (1. Perceber se no Brasil há também outros sentidos que em Portugal existem para 'fazer figura'; 2. Que expressões e ou sentidos são esses? (Fazer figura, fazer figuras tristes, às vezes há figuras melhores do que outras... 🙂 ); 3. O que significam; 4. Quando acontecem?; 5. Por que acontecem?; 6. São evitáveis?; 7. Como?; 8. Queremos ou devemos evitá-los? Porquê?...
É apenas uma partilha, a meu ver com potencial, por partir de um interesse genuíno e forte de um dos participantes, por permitir uma enormíssima variedade de temáticas e por promover a articulação entre a representação via palavra e via desenho.
Se concretizarem a ideia e desejarem partilhar os resultados da sessão, deixem os V/ comentários.
🦉💌









 

segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

As Vozes das Crianças -

Em início de ano parece que temos o futuro todo à nossa frente. É algo que acontece a cada instante,  ter o futuro todo à nossa frente, mesmo que seja  fevereiro,  ou julho ou outubro. 

Mas parece, e só parece, que em janeiro há mais.

Aproveitámos esta sensação para deixar a todos os que quiserem ler e ouvir as vozes das crianças algumas mensagens e ideias que é importante não esquecer. 

QUE MENSAGEM DEIXARIAS AO MUNDO E À HUMANIDADE?

A mensagem é para todos serem amigos uns dos outros e não deixar ninguém de parte e brincar com todos.

Mariana E., 4º ano

Eu quero dizer ao mundo que não importa a cor ou a língua que por dentro todos somos iguais, temos todos os mesmos sentimentos.

Matilde B., 4º ano

A mensagem é que todos sigam os seus sonhos, porque os seus sonhos podem ser o futuro da pessoa.

Martim M., 4º ano

Eu gostaria que toda a humanidade estivesse contra os terroristas, os maus tratos, roubos, raptos, entre outros. E também queria que toda a humanidade percebesse que todos têm um lugar no mundo, sejam de cor diferente, nacionalidade etc Ou seja, que acabasse o racismo, no fundo somos todos iguais.

Beatriz F., 4º ano

Eu quero que não se esqueçam de cuidar bem o nosso mundo. 

David A., 4º ano

A minha mensagem é ser amigo de todos e respeitar uns aos outros.

Gabriel L., 4º ano

Que vocês acreditem em vocês.

Rodrigo S., 3º ano

Eu quero dizer às pessoas no mundo para se lembrarem da família porque sem família não há vida, ficas solitário e sozinho.

Miguel L., 4º ano

Quero dizer às pessoas o que nós queremos e o que nós sentimos de alguma coisa.

Francisca V., 4º ano

As crianças também podem dar sugestões.

Miguel M., 3º ano

As pessoas podiam-se lembrar da natureza e não deitar lixo para o chão, devem-se lembrar do oxigénio (algumas pessoas não têm oxigénio).

Mara M., 3º ano

Eu queria dizer à humanidade para pararem de fazer bullying e de maltratarem as outras pessoas porque somos todos iguais.

Carolina C., 4º ano



Uma Mensagem das Crianças para a Humanidade

Em início de ano parece que temos o futuro todo à nossa frente. É algo que acontece a cada instante,  ter o futuro todo à nossa frente, mesmo que seja  fevereiro,  ou julho ou outubro. 

Mas parece, e só parece, que em janeiro há mais.

Aproveitámos esta sensação para deixar a todos os que quiserem ler e ouvir as vozes das crianças algumas mensagens e ideias que é importante não esquecer. 

QUE MENSAGEM QUERES DEIXAR AO MUNDO E À HUMANIDADE?

A mensagem que eu quero deixar à humanidade é ter mais coisas para brincar como escorregas, porque não há na escola.

Santiago L., 4º ano

Precisamos de mais casas de banho boas porque há muitos sítios que as casas de banho não fecham. 

Gustavo S., 4º ano

A humanidade tem de ajudar os animais porque há muitas espécies em perigo.

Francisca N., 4º ano

A mensagem que quero deixar é que a natureza encha de água, porque é muito importante. A Natureza é que o mundo ficar alegre e faz-nos viver.

Kauan, 4º ano

Que o planeta esteja sempre bem, porque é para as pessoas poderem viver.

Ritieley, 4º ano

Nunca desistir do que queremos porque se desistirmos vamo-nos arrepender no futuro.

Tiago A., 4º ano

A minha mensagem é que coloquem mais caixotes de lixo na cidade e na escola porque estou vendo muito lixo quando venho para cá.

Brayam, 4º ano

Colocar mais lixeiras na escola e pelos lugares públicos porque nós temos que salvar o planeta e não deitar o lixo no chão. Isso vai matar vários animais , vai matar as árvores. E sem eles não conseguimos respirar. Nós precisamos dos animais porque são precisos para a natureza e precisamos dos pássaros para nos alimentarmos.

Elisa, 4º ano

Eu queria que as pessoas respeitassem o ambiente natural para começarmos uma vida nova. E também queria que as pessoas começassem a dar alimentos aos pobres e mendigos. E também que os pais das crianças que já não usam os brinquedos, que os dêem a quem precisa.

Daniela, 4º ano

As pessoas têm que fazer mais doações para as pessoas porque os pobres ficam com fome. 

Santiago S., 4º ano

Não deitar lixo e nem para o mar porque pois polui o ambiente: os animais morrem.

Ícaro, 4º ano

Não podem poluir o ambiente porque assim vamos morrer porque os animais e as plantas morrerão. E a água ficará poluída e não teríamos comida nem bebida.

Daniel A., 4º ano


Eu queria que houvesse mais caixotes do lixo no recreio, também queria que houvesse uns cortinados na sala de aula, pois no verão bate sol em alguns lugares. E queria incentivar as crianças a não desperdiça pois as pessoas desperdiçam muita comida e outras coisas também. Acho que o chão da escola é muito rijo, podíamos ter uma horta na escola e podíamos dar alguns materiais escolares a outras escolas que têm menos. O preço da comida, gasóleo, gasolina e rendas das casa estão a subir e o dinheiro não nasce nas árvores, só é feito de árvores.  Existir mais materiais para brincar no nosso intervalo. 

Leonor, 4º ano

Não matar pessoas porque porque viver é muito importante para a Terra e os animais.

Isabela, 3º ano

Queria que as pessoas não deitassem lixo no mar nem nos lagos e que as pessoas fizessem reciclagem.

José, 4º ano

O que eu queria é que as pessoas reduzissem o desperdício de alimentos e a poluição do ambiente. Eu queria que as pessoas reduzissem a caça ilegal e o lixo marinho porque quase a maioria dos animais que estão em via de extinção estão na caça ilegal e no lixo  marinho.

Queren, 4º ano


Não maltratar os animais porque têm direito a viver saudáveis. 

Ester, 3º ano





 

terça-feira, 12 de outubro de 2021

O que é a Biblioteca? O que é a Escola?

Um pouco inspirados pelo Abécédaire de Michel Sasseville (Abécédaire de la Philosophie pour Enfants), propusémos aos dois grupos, convidados pela Biblioteca Municipal de Torres Vedras, a elaboração de um abecedário que respondesse a:

1. O que é a biblioteca?

2. O que é a escola?

O primeiro grupo, de 3º e 4º anos, deslocou-se à Biblioteca Municipal, alguns alunos estavam ali pela primeira vez, outros costumavam ir com a mãe e outros já tinham ido a outras bibliotecas. «- Na escola da Conquinha havia uma biblioteca e eu ia lá.» (M.)

Perpassando por perguntas sobre se costumam vir à biblioteca, porque vêm à biblioteca, se pagam para lá ir, se pensam ser importante a biblioteca ser grátis, etc, duas ideias fortes surgiram a partir de « - Os adultos não precisam de ler livros.» (S.) Depois de explicitadas concordâncias e discordâncias em relação a esta tese as suas razões («já sabem ler», «já sabem ler bem», «já aprenderam muitas coisas», «a minha mãe lê porque gosta») chegámos a um ponto da discussão muito interessante. « - É importante ler, mesmo em adulto para saber a verdade das coisas.» (B.) 

De facto, ao longo de toda a história, temos - e ainda bem - as bibliotecas como locais de conhecimento, os livros dizem-nos as coisas como elas são.

Mas... Será que há livros que nos enganam?, questionámos. 

E eis, em nosso entender, um dos pontos altos desta sessão de Filosofia para Crianças, na voz da L. e da M.:

L « - Pode haver um livro que tem um título na capa e lá dentro tem coisas falsas.»

M « - E pode haver um livro que se chama livro dos enganos e lá dentro tem enganos.»

E, acrescentamos nós, há livros que nos contam histórias imaginadas, que não aconteceram mesmo: contêm falsidades?

A professora S. prometeu explorar com a turma estas relações entre ficção, falsidade e o paradoxo que existe num livro que diz conter enganos e, de facto, contém.

E nós aguardamos ansiosamente as ideias que advirão desta discussão!


O segundo grupo recebeu a nossa visita na sua própria sala de aula e à proposta A escola é... chegaram palavras como aprender, divertir, TPC. E foi precisamente o TPC que abriu a porta a um dos pontos fortes da sessão:

O TPC serve para treinarmos, para conseguirmos fazer melhor, para estudarmos, para tirarmos dúvidas.

Ao responder como faziam para tirar dúvidas e se as dúvidas eram boas, a M. partilhou que gostava «(...) de ter dúvidas porque assim descobria as coisas.» e, além disso, recolheu uma forte adesão da turma - se já soubéssemos tudo não tinha piada nenhuma, não precisávamos de aprender, e aprender, recuperando duas ideias iniciais, é divertido.

Outro dos pontos que podemos salientar desta sessão é a criatividade empenhada na realização do abecedário, quando a cada aluno calha uma letra «muito difícil»: «- Professora, não há nada com H, eu só sei holofote, hospital, Henrique.»

Bem, a S. acabou por encontrar um H de hoje, porque acha a escola tão fixe que tem de ser já hoje!


Ficam abaixo algumas palavras que compuseram o abecedário para «O que é a biblioteca?» e «O que é escola?»


















segunda-feira, 12 de outubro de 2020

«Tudo ao Contrário», de Luísa Ducla Soares

 A sessão da manhã abriu-se depois de um toque de sineta e de passar por um recreio com macieiras. Sorri de imediato por debaixo da máscara.

Os 25 alunos do 4º ano da escola anuiram com facilidade à proposta de se apresentarem com, além dos elementos mais habituais, a referência ao último ou a um momento maravilhoso que tivessem vivido. Depois de partilhar o meu, um instante em que uma voz na indistinta esplanada se destaca perguntando à família se, além dos cafés, alguém queria bolos - «- Bolos, niguém quer bolos?». Expliquei-lhes que achei o momento simples e maravilhoso, pois não consigo imaginar comer bolos, beber chá e comer bolos ou fazer bolos de modo indisposto ou triste. Há uma alegria boa e simples, aconchegante, em torno disto.

A sessão foi presenteada com vários momentos maravilhosos: ganhar um cão, ganhar um gato, ganhar um canário, ganhar uma Play Station, em ex aequo com ganhar um cão, ir de férias com a mãe («- Mas ir para algum sítio em especial? - Não, só ir de férias.»), ir de férias para o Algarve - voltei a sorrir interiormente.

Lido o poema que dá título a este post, pedi aos alunos para escreverem perguntas a partir dele. As suas reações evidenciam a falta de à vontade com a tarefa: «- Perguntas como? Sobre o texto?»; «- Perguntas?! Mas eu nem sou professor...».

Foi votada a pergunta mais interessante «O que é um bolo com dentes?».

Várias propostas surgiram, como por exemplo: «- Fazem-se os dentes em massapão e põem-se em cima do bolo.» Hummm... Um dente de massapão é um dente? Mas uma analogia irrompeu e não nos deixou explorar esta questão: «- Se um pão com dentes é um pão sem nada, um bolo com dentes é um bolo sem nada. Ou seja, sem recheio ou cobertura!» 

Um segundo momento maravilhoso pode agora ser contado por mim: há uma expressão, pelo menos na área de Torres Vedras, que se refere a comer pão sem nada. Só pão, sem manteiga, sem marmelada... Se é só pão, é pão com dentes. Não é incrível?

Esta analogia levou-nos a condições necessárias e suficientes: «- Bolo com dentes é só feito com farinha, açúcar, ovos e fermento. Não leva nada adicional e que, sozinho, não faz bolo. Não leva cenoura, que sozinha não faz bolo, ou não leva chocolate, que sozinho no forno só vai derreter...»

O tempo passou rapidamente e voltei a passar pelas macieiras do recreio e pela sineta.

Na sessão da tarde, também com um grupo de 4º ano, a alegria de ir ao encontro do meu pedido, de colocarem uma coisa sua ao contrário, como eu fiz com o meu casaco tomou rapidamente conta da sala. Não foi só a Vera que colocou as sapatilhas ao contrário, foi também praticamente metade da sala. Sapatilhas ao contrário, óculos ao contrário, bibes ao contrário, bonés ao contrário...

As sensações foram de desconforto e de não conseguir andar ou ver lá muito bem. Mas ninguém tirou as coisas do seu contrário... Bem, só eu, com a devida autorização dos alunos, porque estava muito calor.

Produziram-se perguntas a partir do texto (as mesmas hesitações com a tarefa, «-  Perguntas como?, Que o texto diz?») e a vencedora como a mais interessante foi «Se ele estava com os pés para o ar e as mãos para o chão, como é que fazia omeletes?»

Desenhou-se rapidamente uma constelação de hipóteses no quadro, umas apelando mais às condições físicas de possibilidade, outras colocando todo o resto do mundo na perspetiva «ao contrário» o que acabou por nos dizer que se TUDO está ao contrário, então, nada está ao contrário. 

O apontar de cenários foi fulguroso e ficámos no pensamento divergente.

Mas uma intervenção mais para o final da sessão deixou-me uma pergunta em mente e mostrou-me, mais uma vez, ostensivamente, que o corpo nos ajuda a pensar, nos revela ideias. Um aluno, sentado na 1ª fila, mostrou-me que tinha o bibe ao contrário, mas de cima para baixo. Não do avesso, não da frente para trás, mas de cima para baixo. Melhor: de cima para baixo e de frente para trás. Se os participantes desta sessão estiverem a ler isto, talvez possam responder: quantos contrários há de uma coisa?


Estas sessões de Filosofia para Crianças decorrem nas escolas do 1º ciclo do Município de Torres Vedras, por iniciativa da Biblioteca Municipal, a quem saudamos pela oportunidade que propiciam aos alunos.
















domingo, 27 de outubro de 2019

Proyecto Pregunta


MIL M2, companhia chilena, esteve presente no Festival Verão Azul com um projecto encantador.

Proyecto Pregunta tem o objectivo de colocar a comunidade a pensar sobre si própria, consigo própria. Tal sublinha e ou relembra a voz do cidadão que, afinal, não é só criado como também cria a sua sociedade. Uma voz política!

Sabe bem encontrar um projecto de base semelhante, que vê na pergunta matéria reflexa lançada no futuro e no desconhecido.

Ficam imagens registadas hoje mesmo em Quarteira, onde ao mesmo tempo se recolheram e expuseram perguntas.

Bem haja pelo V/ trabalho!






terça-feira, 13 de novembro de 2018

Philo, nouvelle génération - documentário


Philo, nouvelle génération, 

Realizado por Christian Mrasilevici, Brigitte Pätzold. França 2018


«Les enfants sont-ils capables de comprendre les concepts philosophiques et même d’en produire avec leurs propres mots ? C’est en tout cas la conviction des initiateurs de l’unique chaire UNESCO au monde destinée à encourager «la pratique de la philosophie avec les enfants», créée en 2016 à Nantes, et dont Edwige Chirouter est la coordinatrice. Ce documentaire suit les promoteurs et praticiens d’ateliers philosophiques destinés aux enfants et aux adolescents dans les écoles ou médiathèques de Paris et de sa banlieue, en Belgique, au Canada et jusqu’au Bénin.
Les enfants s’écoutent, se questionnent et argumentent autour des thèmes comme la liberté, l’égalité, l’animal, la peur ou le temps. Si on veut combattre la violence par le dialogue, la réflexion et l’esprit critique, développons la philosophie pour les enfants!» in http://www.moisdudoc.com/spip.php?rubrique90&IDSeance=3114

quarta-feira, 1 de março de 2017

Sessão de Pensamento: a Justiça, Pequena Conferência


À semelhança do que aconteceu em 2013 com a Beleza, Pequena Conferência, voltamos a ser convidados pela A OFICINA do Centro Cultural Vila Flor a usar o teatro como estímulo para o pensamento.

Desta vez A JUSTIÇA, PEQUENA CONFERÊNCIA - a partir de Jean-Luc Nancy.

Neste trabalho, Maria Duarte, Gonçalo Ferreira de Almeida e João Rodrigues dedicam-se ao texto de Nancy que se inicia assim:
"Creio que vocês - e doravante, quando esta manhã disser vocês, estarei a dirigir-me aos jovens, não aos adultos presentes - talvez não saibam o que é justo e o que é injusto. Talvez não façam ideia, mas, apesar disso sabem muito bem o que é suportar uma injustiça, achar que uma coisa "não é justa” ou mesmo que "é uma grande injustiça”, como sempre dizia um personagem de desenhos animados que se chama Calimero, provavelmente já não o conhecem, é um passarito com meia casca d’ovo à cabeça. Portanto, todos vocês sabem alguma coisa sobre aquilo a que chamamos justo ou injusto. Há pouco, um jovem que está algures nesta sala, quando soube que eu vinha falar do justo e do injusto, perguntou-me directamente - do que é que vais falar, justamente?”

Corrida a cortina, os espectadores transformam-se em participantes de uma Sessão de Pensamento e Diálogo em que são convidados a pensar a Justiça a partir da experiência do teatro-conferência.

Depois dos diálogos a seguir ao espectáculo na Plataforma das Artes e Criatividades, as sessões de pensamento vão às escolas desafiar alunos e professores a pensar a Justiça.